ponto de poder
Numa
segunda-feira ensolarada de julho, última semana das férias que já
duraram pouco, a menina mulher caminhava com os olhos do espírito
colados em cada passo dado, agarrada desesperadamente no movimento do
próprio corpo, nas batidas pálidas do seu coração, em cada ar
escorregando narina adentro, brotando nos alvéolos do pulmão. Era
preciso voltar-se para si sem concessões, à luz do azul infinito.
O
que poderia ter maior poder sobre sua vida naquele momento, senão o
que sempre a mesmerizou: o sonho do amor romântico. Caminhava em
sonho, mas, na manhã de hoje, em sonho de colocar um ponto final. Um
ponto final. Ponto. Um ponto final. Queria ter algum poder, ao
menos algum poder que pudesse, talvez, revelar o seu poder naquela
história falida. Achava que tinha algum poder. Achava que dominava,
achava que o que tinha acontecido acontecia por seu poder. Ao sonhar
com um ponto final, na manhã de hoje, ela pensava poder fazer isso.
Um ponto final.
Um
ponto final resolveria tudo. Resolveria seu problema. Iria lhe
assegurar que a história lhe pertencia. Seria sua autora. Dona da
história, criaria um final para que pudesse pôr fim, de uma vez por
todas, a todas as suas esperas sem fim. Esperas alimentadas por um
amor mal resolvido do lado de lá. Ia assim, sonhando, enquanto
caminhava agarrada ao seu corpo, sôfrega, alienada.
“Do
lado de lá”, pensou, “será que faz sentido?”. Achava que a
paz e a alegria existentes do lado de lá, segundo se contava, eram
sustentadas pelas suas entregas periódicas, insuflantes, animadoras,
estimulantes. Ao mesmo tempo, sabia, lá no fundo, que tudo não
passava de um sonho, ou melhor, de uma especulação edulcorada. Mas,
ousada, insistia. Insistia em ser romântica. O ser amado poderia ter
todas as qualidades mas, se não fosse seu, as perderia. Tinha esse
poder de arrancar qualidades do mundo e não sabia direito. Não
sabia direito que o poder que tinha era o de tornar o mundo um lugar
encantador. Esse era o seu lado menina, composto por vários outros
lados, sendo um deles o lado birrento e, um dos outros, o encantador.
O
seu lado mulher era afável, condescendente, compreensivo,
apaziguador. Um pouco envelhecido, pois moralmente descrente. Nada ia
bem, fora dos corações apaixonados. Ao nascer, um tio-avô disse à
sua mãe: “essa é filha de Nanã Buruquê”.
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