sexta-feira, outubro 11, 2013

Gabriela

Há mais de duas décadas eu renasci. A responsável por isso foi Gabriela Leite. Era uma noite e eu, garota, a vi pela primeira vez pela televisão no momento em que ela, charmosíssima, dizia que era prostituta. Do sofá da sala da casa de meus pais, eu, garota que começava a ter os namoradinhos perseguidos pelos meus irmãos, fixei aquela mulher na retina e na alma.

Anos depois, aquela semente do desejo de conhecê-la começou a germinar. Eu havia ingressado no mestrado em antropologia, depois de percorrer algumas cidades fotografando putas. Eu queria escrever sobre uma área de prostituição na cidade. Por esse caminho, encontrei um grande homem, da mesma estatura de Gabriela em minha vida. Duas grandes pessoas, uma mulher, outro homem. Ambos, pilares da minha existência, nesse "sou" de hoje em dia sem o qual não sou ninguém.

Por esse caminho, meu desejo foi me conduzindo ao encontro com Gabriela Leite, anos depois daquela noite em que a vi e ouvi pela primeira vez. Eu viria descobrir que todo mundo que conhecia a Gabriela nunca se esquecia da primeira vez em que a viu e ouviu. Pois Gabriela é isso: ao vê-la os olhos não mais se desviam dela - ela é magnética! - e ao ouvi-la nosso espírito desperta - ela é saúde e vida!

Entrei pela porta da ong Davida numa tarde em 2000, depois de ter conversado com ela pelo telefone. Ela gostava de dizer que eu estava vestida de Frida Kahlo naquela tarde. Nem eu lembrava do vestido que usava, mas ela, a quem eu olhava e ouvia, me via. Nasceu ali a nossa bela amizade, a melhor amizade que alguém, sobretudo uma mulher, sobretudo eu, poderia sonhar em ter.

Sobre isso, sobre ela, sobre Gabriela, eu posso hoje dizer porque sei, porque pensei, porque sinto: eu amo uma mulher. Eu amo homens e amo uma mulher. E o que a vida me ensina, a minha vida, o meu caminho, o meu desejo e as minhas buscas, é a liberdade. Ter querido e buscado Gabi, ter ouvido o que ela dizia, visto o que ela fazia, ter cuidado dela e ser por ela querida, ou seja, esse próprio caminho, próprio e único da nossa bela amizade, me ensinou a abrir asas e a falar em primeira pessoa.

Muito obrigada, mi ha amiga.