Eis-me aqui, esperando o feijão. Cozinhar é um ato de amor pela espera que se assanha. Nela colocamos cuidado até quando estamos cuidando de outras coisas. Por isso descobri também que é um ato de generosidade. Cozinhar é assaz diferente de esquentar a comida, embora este não seja um ato de todo desprovido de carinho. Até pelo contrário: esquentar o alimento denota gosto. Um tipo de gosto – o pela comida quente.
Eu gosto de comida quente. Só que a quentura não pode ultrapassar o sabor, senão cheira a arrogância. Aí eu como frio que é melhor.
Tem gente que não entende essa escolha pela comida fria e povoa seus argumentos reprovadores com figuras de moral no intuito de nos destituir justamente daquilo que estamos mostrando ter, que é gosto.
Há gosto pra tudo, e é exatamente isto que me faz apostar que para tudo tem solução. Gosto é crença indubitável, fé cega, inquestionável. Definitivamente, gosto não se discute.
Vem de pouco que adquiri o gosto por atos de amor. Foi o espanto do menino com o pombo que me despertou esse bem. Ali fui generosa com o tempo: me deixei admirar a descoberta – a dele e a minha – e nada mais urgia. A generosidade é dona; é, pois, destemida, esvoaça. Decreto o estado de graça!